.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Mulheres do ABC denunciam violência obstétrica

O momento do parto deveria ser o mais feliz da vida de toda mãe. Deveria. Para algumas mulheres – um quarto das brasileiras, segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo – o nascimento do filho virou uma verdadeira história de terror na lembrança. Recusa de anestesia, proibição de acompanhantes (mesmo este sendo um benefício garantido por lei federal desde 2005), xingamentos e humilhações são relatos comuns a todas, que aos poucos, vão perdendo o medo de denunciar e procurar seus direitos. No ABC, ao menos seis mulheres já procuraram advogados para processar hospitais e uma delas, a manicure e moradora de Santo André Elisângela Alberta de Souza, já processa o Hospital da Mulher Maria José dos Santos Stein, do mesmo município.
No início de 2012, Elisangela deu à luz seu segundo filho no Hospital da Mulher. Foi proibida de ser acompanhada pelo marido durante a admissão no hospital, impedida de se movimentar durante o curto trabalho de parto – já que chegou ao hospital quase dando à luz – e sofreu um grande corte na vagina, conhecido como episiotomia, apenas para que os residentes do hospital vissem como se faz o procedimento.
Já foram realizadas duas audiências de conciliação, mas o hospital não apresentou nenhum acordo. O julgamento está marcado para o dia 26 de junho. “Minha expectativa não é nem de ganhar a ação, mas que tudo isso jogue luz nessa questão. Que o judiciário e os gestores se sensibilizem com o que as mulheres passam todos os dias. Quero deixar minha mensagem”, declarou.
A professora Juliana da Silva Santos também deu à luz ao filho no mesmo hospital, em agosto de 2012. Assim como aconteceu com Elisangela, Juliana foi impedida de escolher em que posição preferia ter o filho, foi obrigada a tomar ocitocina na veia (hormônio sintético para acelerar as contrações), a se submeter a uma episiotomia e ainda teve enfermeiras empurrando sua barriga para apressar o nascimento. “Tentei argumentar com todas as intervenções, mas fui coagida pela equipe. Além disso, no momento do parto, ao menos 14 pessoas estavam na sala”, afirmou. Juliana está avaliando com advogados a possibilidade de processar o hospital.
Violências
A culinarista Laura Vitória Alonso, também moradora de Santo André, passou por toda a violência no Hospital Santa Helena, em São Bernardo. Durante o parto, ficou sozinha por mais de sete horas, impedida de se alimentar e até de beber água; contou com a presença do marido apenas no momento do nascimento da filha e não foi anestesiada, mesmo pedindo inúmeras vezes. Sofreu violências físicas e verbais por parte da equipe de enfermagem, além de ter sofrido a episiotomia e sutura do corte sem anestesia. Aguardou mais de sete horas para ver e amamentar a filha. “Sinto mais pelo que ela passou. Posso ter outro parto, ela não vai nascer de novo”, declarou, emocionada. Laura está iniciando processo contra o hospital.


Gestora fala em mudanças no Hospital da Mulher

A superintendente do Hospital da Mulher, Rosa Maria Pinto Aguiar, afirmou que o processo está sendo tratado pelo departamento jurídico e que não comentaria, mas destacou que desde que assumiu a gestão do equipamento, no início de 2013, tem trabalhado com a equipe para implementar mudanças que visem à humanização do atendimento das gestantes e o combate às práticas que possam ser violentas.
“Claro que é um processo. Porém, determinamos que os acompanhantes pudessem ficar com as gestantes desde a admissão até o momento do nascimento. Após o parto, como os quartos são conjuntos, acompanhantes masculinos permanecem apenas até as 22 horas, para que todas as mulheres se sintam mais à vontade”, afirmou a médica. Rosa admite que, em princípio, houve resistência por parte da equipe médica, mas que todos estão se adaptando e que alguns profissionais foram, inclusive, substituídos.
A superintendente afirmou que em todos os casos, são oferecidos métodos alternativos para as dores das contrações e que após o nascimento é estimulada a amamentação e o vínculo entre mãe, pai e bebê. “Temos um índice de 90% de aprovação, mas é claro que existem queixas. Os casos são encaminhados da forma mais adequada”, garantiu.
O Hospital Santa Helena de São Bernardo, citado por Laura Vitória,  não retornou à reportagem até o fechamento da edição. Casos de violência obstétrica podem ser denunciados para a comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pelo e-mail direitos.humanos@oabsp.org.br, para a ouvidoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) 0800-701-9656 ou para o Disque Saúde do Ministério da Saúde, pelo nº 136 e no site do Ministério Público Federal, www.cidadao.mpf.mp.br .

* matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, dia 05/04/2014. Link: http://www.diarioregional.com.br/2014/04/05/sua-regiao/minha-cidade/mulheres-do-abc-denunciam-violencia-obstetrica/

Taxa de cesariana na rede privada do ABC é de 87,5%

Levantamento realizado pela reportagem do Diário Regional junto às prefeituras do ABC identificou que, em 2013, dos 10.891 nascimentos ocorridos em hospitais privados até agosto, 87,5% foram por via cirúrgica. A taxa é quase seis vezes maior do que a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), que afirma que as cesarianas não devem ultrapassar 15% do total dos nascimentos. Na rede pública, o número é menor, mas ainda longe do ideal: 43,6% dos bebês nasceram em cirurgias. A taxa total da região é de 65,2% de cesáreas, no total de 22.066 nascimentos. Em 2011, a taxa ficou em 64,68%.
O coordenador do Grupo de Trabalho (GT) Saúde do Consórcio Intermunicipal do ABC e secretário de Saúde de São Bernardo, Arthur Chioro, classificou a situação dos hospitais privados como epidêmica. “Não tem nada, ciência, evidência cientifica, não tem boas práticas médicas que possam justificar isso”, afirmou. Chioro destacou que, apesar das prefeituras terem responsabilidade pela promoção da saúde em todo o território, a capacidade de regulação sobre os serviços privados é praticamente nenhuma. “A não ser os instrumentos de vigilância sanitária e a capacidade de convencimento. Dialogar, chamar (os gestores), identificar os problemas associados a essa epidemia de cesariana”, completou.
“Porém, acho que, fundamentalmente, nosso maior papel é em relação à conscientização da população, em particular das mulheres, da revalorização do parto normal”, completou. Para o coordenador, em muitos casos, são as próprias gestantes que já chegam aos consultórios particulares e de convênios pedindo pela cesariana. “As mulheres precisam compreender que um parto normal não é necessariamente um parto com dor. Bem cuidado, bem assistido, só tem vantagens. Para o bebê que nasce na hora certa e, portanto, tem menos prematuridade, e para a mulher por que não é cirurgia”, explicou.
Documentário
Lançado este ano, o documentário O Renascimento do Parto, apresenta diversos relatos de mulheres que foram submetidas a cesarianas, não por opção, mas porque foram induzidas de alguma forma pelos médicos, com alegações não baseadas em evidências científicas. Mães, pais e profissionais que apoiam o parto normal relatam como essa experiência pode ser traumática e a cesárea sem indicação médica clara é classificada como violência obstétrica.
O professor de Obstetrícia da Faculdade de Medicina do ABC Mauro Sancovski entende que essa afirmação é temerária. “Podemos acreditar que em alguns casos o critério para realização da cesárea não obedeceu a uma indicação de natureza estritamente obstétrica, mas podendo ser de interesse mútuo do médico assistente e da mulher, desta forma o consentimento desqualifica este rótulo”, pontuou.
“Em se tratando se hospitais privados, em muitos casos a gestante e o médico que vai assisti-la já tiveram muitos contatos prévios no pré-natal e a cesárea, mesmo quando eletiva, já foi acordada. Em casos onde o médico optou sem as devidas justificativas e sem o aval da gestante ou da parturiente, poderíamos sim, considerar como uma violência obstétrica”, completou.
A Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) e a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) foram procuradas, mas se abstiveram de comentar os dados.

* matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, no dia 19/10/2013. Link: http://www.diarioregional.com.br/2013/10/19/sua-regiao/minha-cidade/taxa-de-cesariana-na-rede-privada-do-abc-e-de-875/

Processo contra violência obstétrica que tramita em Santo André é a primeira do gênero na região

A manicure e moradora de Santo André Elisangela Alberta de Souza é autora da primeira ação que trata de violência obstétrica no ABC. No início de 2012, Elis deu à luz seu segundo filho no Hospital da Mulher, em Santo André. Tendo se preparado durante toda a gestação para um parto normal e sem intervenções e sabendo que teria seu filho em um hospital considerado referência na região, a munícipe nunca imaginou que passaria por momentos de violência.
Elis passou todo o início do trabalho de parto em casa e só foi para o hospital quando as contrações já estavam com intervalos bem curtos, o que indica que o nascimento está próximo. “Já cheguei ao hospital com dilatação total, mas fiquei sozinha na triagem, pois não permitiram que meu marido me acompanhasse”, disse. Mesmo com o filho já praticamente nascendo, a médica que atendeu o parto (e que é ré no processo) estourou a bolsa artificialmente e realizou uma episiotomia (corte na vagina), procedimentos desaconselhados a serem feitos rotineiramente pela Organização Mundial de Saúde.
“Acreditamos que os procedimentos foram feitos porque dentro da sala de parto estavam alguns residentes. A minha cliente não foi consultada nem informada sobre nenhum deles, o que configura violência obstétrica”, explicou a advogada Priscila Cavalcanti. A audiência de conciliação aconteceu no Fórum de Santo André no dia 21 de novembro, mas a médica (que não teve seu nome divulgado) não compareceu, pois não foi avisada a tempo. A representante oficial do hospital não propôs acordo conciliatório e a audiência foi remarcada para 14 de março de 2014. “Tanto a conciliadora quanto a representante do hospital se emocionaram muito com o relato. Achamos isso curioso e positivo”, completou a advogada.
Para Elis, houve muita receptividade para um assunto que ainda é novo nos tribunais e que sua expectativa é mostrar que as mulheres, enquanto cidadãs, têm direitos e que o mínimo que todas têm a fazer por si e por seus filhos é brigar por eles. “Estou muito satisfeita, pois foi muito positiva a primeira impressão. Foram 21 meses de busca, leitura, estudo, conversa em grupos virtuais e presenciais, terapia, amigas. Foi uma saga”, concluiu.

* matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, no dia 24/11/2013. Link http://www.diarioregional.com.br/2013/11/24/sua-regiao/minha-cidade/acao-que-tramita-em-santo-andre-e-a-primeira-do-genero-na-regiao/

25% das mulheres sofrem violência em maternidades brasileiras

Foto integrante do projeto 1em4 de Carla Raiter


A violência obstétrica é um termo relativamente novo, mas sua prática, tão antiga quanto se possa imaginar. É aquela enfermeira que diz para a mulher que está com contrações: “na hora de fazer não chorou, por que está chorando agora?” Ou aquele anestesista que briga com a gestante, que não ‘para quieta’, para que aplique a anestesia.Ou aquele outro profissional de saúde, médico ou enfermeiro, que sobe sobre a barriga da mulher, para acelerar o processo de saída do bebê. Esses relatos foram feitos por moradoras do ABC e são a realidade de muitas outras, Brasil a fora.

Pesquisa da Fundação Perseu Abramo, realizada em 2010, identificou que 25% sofreram algum tipo de violência durante atendimento em maternidades públicas e privadas, como exames feitos de forma dolorosa, falta de informação sobre os procedimentos que seriam realizados, gritos, xingamentos e até agressões físicas. Outros tipos mais sutis de violência, mas que também estão presentes na realidade das gestantes brasileiras, são as cesáreas indesejadas (normalmente indicadas apenas por conveniência médica) e longos períodos de afastamento dos bebês após o nascimento.

A professora Claudia Martinez da Conceição, moradora de Santo André, relata que começou a sentir contrações no dia em que completou 36 semanas de gestação. “Fui para o hospital com meu marido e depois de passar por um exame de toque (exame que avalia a dilatação) sem ao menos ter sido avisada, aguardei por mais de uma hora para conseguir realizar um cardiotoco (avaliação dos batimentos do coração do bebê)”, afirmou.
Cesariana
Claudia conta que após aguardar algumas horas, foi informada que seria submetida a uma cesariana, mas não disseram por quais motivos. “Me transportaram para o centro cirúrgico, uma sensação horrível, deitada naquela maca gelada, com medo, assustada. Para dizer a verdade apavorada”, afirmou.
Os efeitos da violência que as mulheres passam, seja por maus tratos, seja por terem sido submetidas uma cesárea indesejada, foram objeto de estudo da psicóloga Heloisa Salgado, que apresentou no Programa de Póss-graduação da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) a dissertação A experiência da cesárea indesejada: perspectivas das mulheres sobre decisões e suas implicações no parto e nascimento.
“Recebi relatos profundos e impressionantes de mulheres que compartilharam comigo essa sua experiência e que encontraram um espaço para dividir suas vivências e, principalmente, elaborá-las”, afirmou. “Várias mulheres con­sideraram que essa oportunidade serviu de processo para entender o que tinham vivido e que compartilhar as ajudavam pessoalmente na elaboração, bem como ajudariam outras mulheres a evitar passar pelo mesmo”, explicou.

Para médico, discussões sobre o tema podem mudar conduta
O professor de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina do ABC e Diretor Técnico do Hospital da Mulher de Santo André,  Mauro Sancovski, acredita que os debates que vêm sendo realizados a cerca da violência obstétrica vão acabar por modificar o modelo de atendimento nas maternidades. “A gente vive um momento de discussão em todas as áreas. As mulheres estão entendendo que alguns procedimentos não são mais aceitáveis”, afirmou.
Segundo o professor, as faculdades de medicina já têm a preocupação de mudar o perfil de atendimento das gestantes. “Orientamos que as mulheres sejam ouvidas, informadas sobre todos os procedimentos, respeitadas na sua individualidade”, explicou.
Apesar do discurso otimista do médico, os dados revelam uma realidade diferente. Pesquisa da Fundação Perseu Abramo, realizada em 2010, identificou que 25% das mulheres sofreram algum tipo de violência durante atendimento no parto ou no pré-natal. “Sei que existe uma resistência por parte de alguns médicos e profissionais da área, em especial os mais velhos. Precisamos continuar insistindo na mudança dessa postura”, completou.

Em Belo Horizonte, mulher move primeiro processo contra hospital

A auxiliar administrativo Ana Paula Garcia se preparou muito para ter um parto natural. Aos oito meses de gravidez, foi surpreendida com um trabalho de parto prematuro. Com o rompimento da bolsa, chegou em uma maternidade particular de Belo Horizonte (MG) faltando apenas dois centímetros para dilatação total e nascimento de sua primeira filha.
Ana Paula foi anestesiada mesmo se negando a receber o medicamento. “Disseram que eu não era índia para aguentar um parto sem tomar nada”, lembrou. Após uma série de procedimentos feitos contra sua vontade, como corte na vagina para aumentar o canal de passagem do bebê, ter sido anestesiada e impedida de se movimentar logo após o nascimento, Ana teve de conviver com a morte do bebê, após uma gestação saudável e sem qualquer intercorrência.
“Ninguém me explicou o que realmente tinha acontecido. Reclamei no Ministério da Saúde, no convênio, na ouvidoria do hospital, no Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais e na Agência Nacional de Saúde Suplementar. Não obtive nenhum retorno. Conheci minha advogada e juntas resolvemos ajuizar ação civil por violência obstétrica contra a equipe, o plano de saúde e o hospital”, declarou.
Essa é a primeira ação do gênero. “O processo apresenta o conceito de violência obstétrica, que ainda não existe para o judiciário. Não é um processo por erro médico. Questiona toda a conduta da equipe, é contra o proceder, o tratar, o atendimento contrário aos direitos humanos”, explicou a advogada Gabriela Sallit. “A Ana não quer que ninguém seja preso. O que esperamos é uma mudança de comportamento”, completou.

Projeto fotográfico denuncia agressões na internet


A fotógrafa Carla Raiter é especialista em ensaios de partos humanizados. “Fotografar esse nascimentos era uma forma de me manter envolvida com o tema (depois do nascimento do filho) ajudando outras mulheres em várias redes de apoio e mostrando o quão respeitoso e bonito um parto pode ser”, explicou. Porém,  o sentimento de que aquele era só mais um projeto, no meio de tantos, a levou a abordar outro tema. Em uma conversa com Caroline Ferreira, sua parceira no Projeto 1:4, surgiu a ideia de retratar a violência obstétrica.
O nome do projeto é uma menção à pesquisa da Fundação Perseu Abramo, que aponta que uma em cada quatro mulheres passa por violência obstétrica. Carla usa fotos em preto em branco e os depoimentos “tatuados na pele” para retratar as experiências. “O objetivo é denunciar, chamar atenção e promover o debate sobre o tema. Tenho percebido que as marcas que esse tipo de violência deixa são muito maiores do que imaginávamos quando idealizamos o projeto”, explicou. “Os sentimentos são de lembranças negativas, de partos roubados, de corpos invadidos, de abandono e dor. Há mulheres que afirmam que o desejo de ter vários filhos foi extinto depois do primeiro parto”, completou.
Carla acredita que a proporção de mulheres que passam por esse tipo de violência seja bem maior do que um quarto do total. “Apesar de haver os casos extremos que não deixam dúvidas, na maioria das vezes a violência obstétrica é muito sutil, entra nas práticas médicas de forma muito amalgamada”, afirmou. O projeto pode ser conferido no Facebook, pelo link www.facebook.com/projeto1em4.

*matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, no dia 28/04/2013. Link: http://www.diarioregional.com.br/2013/04/28/sua-regiao/minha-cidade/regional/25-das-mulheres-sofrem-violencia-em-maternidades-brasileiras/

Diadema aprova lei contra violência obstétrica

A Câmara de Diadema aprovou no fim de setembro projeto de lei que dispõe sobre a implementação de medidas de informação à gestante e parturiente sobre a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, visando, principalmente, à proteção contra a violência obstétrica nos hospitais públicos e privados da cidade. O projeto 077/2013 é de autoria do vereador João Gomes e foi aprovado por unanimidade pelos demais parlamentares. O prefeito tem até 15 deste mês para sancionar o texto.
Gomes, que também é pastor, explicou que durante muitos anos realizou trabalhos sociais em presídios e soube de relatos de detentas que passaram por diversas violências durante o nascimento de seus filhos. “Uma deu à luz em um banheiro sujo, algemada, sem as mínimas condições”, afirmou. “Também chegou até nós depoimentos de mulheres que foram mal tratadas em hospitais. Submetidas a repetidos exames de toque, em situações muito humilhantes”, completou.
Assessorado por sua equipe, o vereador fez extensa pesquisa sobre o assunto, a fim de formular uma lei que pudesse coibir essa prática, que segundo dados da Fundação Perseu Abramo, foi vivenciada por 25% das mulheres entrevistadas em 2011. “Nossa expectativa é que o projeto seja sancionado em breve. Praticamente não vai gerar custos ao município, pois poderá ser implementado por meio de palestras de conscientização da equipe. Caberá à prefeitura também fiscalizar os hospitais privados”, detalhou.
O texto da lei classifica como violência obstétrica diversas situações, como fazer graça ou recriminar a parturiente por qualquer comportamento como gritar, chorar, ter medo, vergonha ou dúvidas; indicar cesariana sem respaldo nas evidências científicas; e impedir que a mulher seja acompanhada por alguém de sua escolha durante todo o trabalho de parto. “O projeto, inclusive, ratifica a Lei do Acompanhante, promulgada em 2005, mas que ainda é desrespeitada”, completou o parlamentar.
A prefeitura deve elaborar cartilha explicando em termos claros os direitos das gestantes e parturientes e fiscalizar a fixação de cartazes com as mesmas informações nos estabelecimentos de saúde. Diadema é a primeira cidade do país a ter uma legislação que trata da violência obstétrica. “Foi o pontapé inicial. Já estou em contato com vereadores de outras cidades e também com os órgãos superiores do partido (PRB) para que essa iniciativa chegue a outros municípios”, finalizou. O vereador será homenageado pelo Movimento de Doulas e Parteiras do ABC no próximo dia 19, durante encontro municipal do PRB Mulher realizado na Câmara de Diadema.

*matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, dia 09/10/2013. Link http://www.diarioregional.com.br/2013/10/09/sua-regiao/minha-cidade/diadema-aprova-lei-contra-violencia-obstetrica/

OAB cria comissão sobre violência obstétrica

O termo violência obstétrica é desconhecido por muitas pessoas, inclusive pelas vítimas. Mulheres que durante o trabalho de parto e o parto são xingadas, humilhadas ou ouvem piadinhas das pessoas que as atendem; que têm o direito ao acompanhante negado ou são submetidas as procedimentos sem aviso ou consentimento. Pesquisa de 2010 da Fundação Perseu Abramo identificou que um quarto das parturientes passou por uma situação de violência e, por isso, a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)SP criou a Coordenadoria da Violência Obstétrica.
O objetivo é dar voz às mulheres agredidas durante a gestação, parto e pós-parto. “As ações mais citadas no estudo (Mulheres brasileiras e Gênero nos espaços público e privado) são gritos, intervenções sem o consentimento informado, exames dolorosos, não oferecimento de métodos para alívio da dor e negativa de atendimento”, explicou a advogada e integrante da comissão Tatiana Jaskow MacNicol.
Os trabalhos estão no início, mas já foram constatadas condutas inadequadas e rotineiras nas maternidades como, por exemplo, o contínuo desrespeito à Lei do Acompanhante (que prevê o direito da parturiente de estar acompanhada por alguém de sua escolha durante todo o processo do parto e nascimento); a separação da mãe e do bebê saudável nas primeiras horas de vida; e o alto índice de cesáreas eletivas realizadas sem necessidade clínica, baseadas na comodidade médica, coação e/ou dissuasão da gestante.
Demandas
Não existe prazo para a conclusão dos trabalhos e, segundo Tatiana, não é possível, ainda, ver o fim das demandas. “O números de irregularidades, crimes e más condutas é assustador. Os casos são diversos e exigem condutas diferenciadas. Atualmente encaminhamos para o Ministério Público alguns relatos que, em conjunto, mostram um “modus operandi” desumano dentro de renomadas maternidades paulistas, o que muito provavelmente resultará na abertura de inquéritos”, esclareceu a advogada.
A falta de entendimento do judiciário sobre o que é violência obstétrica também é uma dificuldade. “A legislação pátria ainda não tipificou esse tipo de crime e também não existe entendimento jurisprudencial. Porém, a exemplo de países vizinhos, acredito que estamos caminhando para ordenamentos específicos e em breve teremos as primeiras sentenças de ações judiciais que tramitarem pelos fóruns com essa temática”, completou. A Câmara de Diadema aprovou em setembro a primeira legislação do país que combate a violência obstétrica. A lei 077/2013 aguarda sanção do prefeito Lauro Michels.
Denúncias para a comissão da OAB podem ser feitas pelo e-mail direitos.humanos@oabsp.org.br, para a ouvidoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) 0800-701-9656 ou para o Disque Saúde do Ministério da Saúde, pelo nº 136. “Os canais funcionam de modo geral, mas seria de grande valia uma capacitação dos atendentes em relação à violência obstétrica”, concluiu a advogada.

*matéria de minha autoria, originalmente publicada no Diário Regional, no dia 24/11/2013. http://www.diarioregional.com.br/2013/11/24/editorias/noticias-gerais/oab-cria-comissao-sobre-violencia-obstetrica/

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

A maternidade e o peso

Quando nos tornamos mãe, toda nossa vida muda. Tudo. Desde a textura do cabelo, a quantidade de pelos no corpo, o formato dos seios, da barriga. E não é apenas uma mudança física. Nossa visão de mundo, nossas perspectivas, nossos objetivos, nossas prioridades. É uma verdadeira revolução. Junto com aquela criança, nasce uma nova mulher. Aconteceu comigo, tenho certeza que acontece com todas, em menor ou em maior proporção (ou percepção!).

Fui uma adolescente gorda. Ou pelo menos era assim que me enxergava. Hoje, olhando minhas fotos de 15, 10 anos atrás, percebo o quanto tinha uma imagem distorcida de mim mesma. É verdade que na fase onde me achava mais acima do peso e inadequada, evitava tirar fotos. Não existiam as câmeras digitais de hoje e era mais fácil manter o anonimato. Mas os registros que eu tenho, com 15, 16, 18 anos, mostram uma garota nem gorda nem magra.

Esse sempre foi o meu trauma. Ser gorda. Cheguei a pesar 79 quilos perto dos 19 anos. Com 1,62, não era exatamente proporcional. Depois que entrei na faculdade, a correria de estudar e trabalhar e um regime que consistiu em não jantar e não comer arroz e feijão no almoço me ajudou a perder mais de 10 quilos. Fiquei magra. Mas sempre me achava gorda.

Quando engravidei, estava com os meus tão queridos 60 quilos. Sempre foi difícil me manter nesse peso, então, fiquei em pânico pensando nos quilos que iria ganhar. Enjôos fortes no primeiro trimestre e um medo enorme de virar uma baleia me ajudaram a segurar a onde e engordar 10 quilos durante toda a gestação.

Depois do parto e com a amamentação prolongada até os 3 anos, não foi difícil ficar novamente na casa dos 60. Até dois anos atrás, quando a Ana Beatriz desmamou. Desde então, engordei oito quilos e hoje peso 68. Não são os 79 que me apavoravam, mas também não são os 60 que me deixavam mais feliz.

E é aí que entram as mudanças. Porque hoje, não me sinto infeliz com o meu corpo. Hoje, o que me incomoda são as roupas que não me servem e se tivesse dinheiro acho que trocava todo o meu guarda-roupa. Acho que a maternidade faz a gente enxergar como essas preocupações são pequenas.

Penso também no risco de mostrar para a minha filha, desde cedo, que essa preocupação com o peso deve motivar a nossa vida. Não tive esse exemplo da minha mãe. Também porque ela sempre foi magra. Minha mãe era magra, minhas primas eram magras, só eu era gorda. Ou me achava gorda. E é isso. A maternidade já é pesada o bastante para a gente se preocupar com outros pesos.