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sexta-feira, 18 de junho de 2010

Nunca te vi, sempre te amei - Relato do parto da Ana Beatriz

Procurei nos arquivos da lista do yahoo Parto Nosso e achei o relato do parto da Bia... vou colocar aqui na íntegra, e depois faço alguns comentários.

A gravidez


Dia 11/10, 13 dias antes da Bia nascer

Descobrir que eu estava grávida foi, ao mesmo tempo, muita alegria; pois já há um bom tempo eu sempre dizia que me sentia preparada, pronta pra ser mãe; e susto; pois não foi nada planejado, o Ale e eu estávamos juntos há apenas dois meses. Já nos conhecíamos há muito tempo, ficamos quatro anos sem nenhum contato, e quando nos reencontramos foi amor à segunda vista.

Eu sempre pensei em ter um parto normal, nunca quis uma cesárea, mas depois de engravidar, comecei a pesquisar sobre partos e descobri que o que eu achava ser o parto normal não tinha lá tanta normalidade. Induções, intervenções mil, tudo fazendo de um momento lindo um processo quase industrial. Não, definitivamente, aquilo não era o que eu queria pra mim e pro baby.

Logo que eu engravidei tive que mudar de ginecologista por causa do plano de saúde, e o meu novo médico era um senhor bem tradicionalista. Aos quase 4 meses de gravidez, eu o questionei se o fato de eu ter retirado um mioma do útero 6 anos antes seria impeditivo para o meu parto normal. Ele disse que sim, que não havia por que correr riscos, que o melhor era marcarmos uma cesárea.

Á essa altura, eu já estava participando da lista PartoNosso, e já esperava essa resposta. Então, calmamente, saí do consultório e nunca mais voltei. Conversando com a minha sogra, ela disse: "Vamos à minha médica! Ela é ótima! É médica da metade da família, e super a favor de parto normal!".

Que bom! Fomos à médica, no dia seguinte. Levei meus exames, e comecei a contar pra ela minha história, e frisei: "Pelo que eu andei lendo, eu posso sim ter um parto normal, e por isso quis procurar uma segunda opinião." E a "super-médica-a-favor-do- parto" me disse: "Nem pensar! Pra você, só cesárea. E de 38 semanas, por que se você entrar em trabalho de parto, o seu útero pode se romper, vc pode morrer, seu bebê pode morrer... não precisa correr riscos. As cesáreas hoje são super seguras, a recuperação é tranquila. Parto natural, parto humanizado, é tudo muito bonito, mas depois de 5 ou 6 horas de trabalho de parto vc vai IMPLORAR (sim, foi isso o que ela disse. Pra uma pessoa que ela nunca havia visto até aquele dia) por uma cesárea."

Eu fiquei tão chocada, que nem tive resposta. Saí do consultório, liguei pra minha mãe aos prantos, não havia nada que me consolasse, meu mundo havia caído. No dia seguinte, eu enviei um e-mail pra lista (Parto Nosso) contando todos os detalhes, e claro, recebi muito apoio, respostas sinceras, e um conselho que eu nunca mais esqueci, de um obstetra que realmente apóia o parto normal, Dr.Ric Jones:"Riscos existem sempre, em tudo, mas o que devemos avaliar é se vale a pena e se queremos de verdade correr esses riscos." Não foram exatamente essas palavras, mas o contexto era esse. A Rebeca também me escreveu, foi super carinhosa e amiga, me encaminhou artigos e coisas relacionadas ao meu caso. Comecei então a procurar um médico que pudesse respeitar a minha vontade. Cheguei a ligar pro meu antigo ginecologista, que fez a minha miomectomia, e ele também disse que o melhor era a cesárea.

Depois de muitos telefonemas (eu precisava de um médico que atendesse ao meu convênio) encontrei o Dr. Antonio Julio. Nunca tivemos uma "super relação", mas desde o começo ele disse que não havia por que eu não ter o parto normal. Que já tinha muito tempo que eu havia feito a cirurgia, e que eu era absolutamente saudável e pronta pra parir.
E assim foi. Ele não pedia muitos exames, o que me deixava tranquila, pois não ficava procurando pêlo em ovo. Também não fazia exame de toque, fez um, a gestação toda, uma semana antes da Ana Beatriz nascer. Apenas me pesava, media a barriga e escutava o bebê.

Meu marido, que apesar de ter tido dois filhos no primeiro casamento, nunca acompanhou tão de perto as gestações da ex-esposa, achava que o médico não sabia de nada. E a minha sogra, que confiava muito na médica dela, também ouvia com desconfiança as minhas ideias sobre parto.

Fora isso, todo mundo pra quem eu contava que queria um parto normal, sem anestesia, sem intervenções, dizia que eu era louca, que devia morar numa caverna, que eu não ia aguentar a dor, que eu achava que ter filho era brincar de boneca, e etc. Então, eu simplesmente parei de falar pra quem não adiantava.
outro sábio conselho que eu ouvi aqui na lista (Parto Nosso).

A gravidez foi super tranquila, nada atípica. Enjôos no primeiro trimestre, e um cansaço enorme no final.

Os pródromos
No dia 10/10 viajamos pra uma cidade de Minas, Extrema. Eu estava então com 37 semanas. No dia 11, de noite, eu comecei a sentir umas coliquinhas, bem fracas, no pé da barriga. Mas elas não tinham regularidade, e nem incomodaram.

No dia 17/10 eu fui à consulta, fiz o primeiro e único exame de toque, e não tinha nada de dilatação, colo duro, o médico disse que podia ser na próxima semana, ou ainda demorar. A DPP (data provável do parto) era 27/10.

O dia D
No dia 23/10 eu fui ao mercado com o meu marido. Procurava fazer tudo a pé, pois sabia que isso ajudaria no trabalho de parto. Na volta, eu senti umas cólicas muito fortes, eu tinha que parar e me abaixar, e todo mundo me olhando, sem entender nada. Mas passou logo e eu achei que não ia dar em nada.

No dia 24/10 eu acordei às 6h da manhã para ir ao banheiro, e continuava com cólica, parecia cólica menstrual, mas estava fraca. Não tinha sangramento nem perda de líquido. O Ale saiu pro trabalho às 9h, pediu pra eu ligar se alguma coisa acontecesse. Levantei, não conseguia mais dormir por causa da cólica.
Subi escadas, coloquei roupa no varal, varri o chão, e então as cólicas começaram a ficar mais fortes. Tão fortes, que quando elas vinham eu tinha que parar o que estivesse fazendo e me abaixar. Sentar ou deitar era impossível. Eram as contrações. Então era isso, estava começando. Por volta das 11h eu liguei pra
minha mãe e contei o que estava acontecendo. Ela disse que podia ser o início do trabalho de parto, que eu tentasse contar os intervalos. Á essa altura, os intervalos estavam irregulares, entre 40 e 25 min. Tive dor de barriga, vomitei o café da manhã... era meu corpo se limpando, se preparando.

Quando o Ale chegou, por volta das 13h para irmos ao médico, pois era o dia da consulta, as contrações já haviam diminuído o intervalo, estavam entre 12 e 8 min. Aí ele ligou pro médico e foi orientado que seguíssemos pra maternidade. Nessa hora eu fiquei com medo, pois achava que tava cedo, e imaginava que por ser minha primeira filha ia demorar.

O Ale estava preocupado, não queria ficar em casa, então eu disse que ia, mas que se quisessem fazer alguma coisa no hospital pra me empurrar pra uma cesárea, que eu ia sair correndo...rsrs. ..

O Ale ligou pra um amigo dele ir nos buscar, por que a gente não tem carro, só moto, e na moto eu não ia aguentar as contrações...rsrsrs. ..

Quando o amigo dele chegou as contrações já estavam de 5 em 5 min. A gente tinha pensado em passar antes no laboratório, pra pegar os últimos exames que o médico havia pedido, mas como as contrações estavam com um intervalo pequeno, fomos direto pra maternidade.

Chegamos à maternidade por volta das 4h da tarde, e as contrações diminuíram o ritmo, já ficaram com os espaços irregulares. Quando elas vinham ainda eram fortes, mas no intervalo, eu estava super bem, conversava e ria. O Ale disse: "pára de ficar rindo, por que eles vão achar que vc não tem nada e não vão te atender!". E eu respondi:"mas eu não tenho nada, mesmo, tô ótima, só vou ter um filho".

Na sala de espera tinha mais duas gestantes, uma no soro e a outra com dor e sentada. Eu falei pra que ela levantasse e se movimentasse, que isso ajudaria com a dor, e as enfermeiras começaram a me olhar com cara feia.

Aí me chamaram pra ser avaliada por uma enfermeira. Já estava com 4cm de dilatação, e o Ale até viu o cabelinho da nossa bebê. Nessa hora eu fiquei muito emocionada, por que sabia que realmente estava acontecendo.

Ligaram pro meu médico e quando ele disse que eu não queria soro, nem anestesia, nem tricotomia, as duas enfermeiras se olharam com cara de quem não estavam entendendo nada. Ainda com as enfermeiras, preenchendo uma ficha entre as contrações, elas disseram que esse não era um pedido comum, e perguntaram se eu tinha certeza que não queria a anestesia.

Eu disse que sim, e contei resumidamente a minha busca pelo parto normal. Virei então uma espécie de "celebridade" no hospital. Toda enfermeira que passava por mim no caminho da sala de parto, a enfermeira que estava me acompanhando comentava: "vai tentar normal, e sem anestesia".

Ao mesmo tempo em que eu achava engraçado, isso me irritava, primeiro por que eu não ia tentar, eu ia ter um parto normal. Segundo, por que isso era o normal, qual era o espanto?!?!? ! Coisas da matrix.

Na sala de parto eu fiquei um pouco sozinha, esperando o Ale terminar a papelada e se trocar, e ficava andando, só parando na hora das contrações. Pedi pra uma enfermeira algo pra comer, por que o médico tinha liberado minha dieta e eu não tinha nada no estômago.

O Ale chegou antes da comida, e então, a cada contração, eu me jogava nos braços dele, pra poder relaxar.
Já tava suando, e com tanto calor, tirei aquela camisola pesada e fiquei só com uma levinha, não sei qual o nome. E o Ale preocupado que iam ver meus peitos....rsrsrs. ... eu queria era estar pelada!

A comida chegou, mas eu mal consegui tomar umas colheradas de sopa e o suco, que o Ale dava na minha boca, por que já estava com mais dor. Continuava andando pelo quarto, abaixando e me levantando, e o Ale me segurando nas contrações. As enfermeiras entravam e saíam do quarto, e de vez em quando
uma perguntava: ela não vai mesmo querer a anestesia?

Não sabia há quanto tempo eu estava lá, nessa hora a gente perde um pouco a noção. Mas eu estava com muita dor, e pedi pra uma das enfermeiras se eu podia ir pro chuveiro. Ela disse que ia ver com uma outra.
A outra chegou e disse que sim, mas que antes tinha que fazer um exame de toque.

Que tortura, por que eu tinha que deitar, e ter contrações deitada, pra mim, era a pior coisa do mundo. Eu já estava com 7cm, o tp evoluía bem, e eu fui pro chuveiro. Antes disso, foi feito o cardiotoco, que tbm foi horrível, por que mais uma vez eu tive que ficar deitada.

Fiquei no chuveiro um tempão, não lembro o quanto, mas foi ótimo, aliviava muito as dores. O Ale falava comigo, mas eu não lembro o que, nessa hora tbm estava quase em transe.

Quando o médico chegou pediu pra eu sair quando quisesse, por que ele tinha que ver como estava a dilatação. Quando eu saí, percebi que começava à perder parte do tampão, por que escorria uma geléinha pelas minhas pernas. Já estava com 9cm e o médico disse que iria estourar a bolsa, que isso faria com que fosse mais rápido. Ele estourou e as contrações ficaram quase sem intervalo, uma em cima da outra, uma loucura. Vomitei de novo o pouco almoço que eu tinha no estômago.

Aí, tentei parir sentada. Fazia força, mas acho que fazia errada, por que não dava. O médico ficava olhando pra ver quando vinha a contração, e dizia, faz força, mas eu não sentia vontade. Uma enfermeira perguntou pra ele: "o senhor não vai fazer episio?". Eu dei um grito, quase um gemido: "nããããooooo...", mas acho que ninguém entendeu...

Levantei, tentei de cócoras. Fazia tanta força que eu fiz xixi. Tentei me apoiar na cama, de costas, mas também não dava. Aí, sentei de novo. Acho que era a posição de 45 graus, mas o médico estava
sentado bem mais baixo que eu. Aí ele viu que tinha um rebordo (um pedaço do colo do útero que impedia que a cabeça da Bia passasse), e me avisou que ia tirar. Isso sim doeu mais do que qualquer contração.

Aí ele falou: "ela já tá vindo, é só vc fazer força". Eu não senti o tal anel de fogo, mas comecei a sentir uma vontade louca de fazer força, e senti a cabeça dela saindo. Já não era dor, era uma sensação indescritível. Quando eu ia fazer mais uma força, o médico mandou que eu parasse, por que se não ia lacerar. O Ale dizia: "pára, Li, pára!". Não sei como eu consegui parar, por que a vontade era quase incontrolável.
Aí ele disse: "agora, pode fazer força agora". Eu fiz e ela nasceu. Senti passar a cabeça, depois o corpinho, e aquela sensação de alívio.

Ana Beatriz nasceu chorando, e veio direto pro meu colo. Eu olhava e quase não acreditava, ela estava ali, nos meus braços... tanta emoção, tanto amor... ela não quis mamar. Só cheirou e lambeu o bico do seio, e foi se acalmando, e eu conversando com ela baixinho, dizendo: "oi, filha... é a mamãe... a gente conseguiu... eu te amo muito...". Chorava e ria, ao mesmo tempo, era realmente muita emoção.
Ela nasceu 20h13, 4 horas de trabalho de parto, com 39sem e 3 dias. E eu não IMPLOREI pela cesárea.

Não lembro se senti a placenta saindo. Sei que fiquei ali, com ela, e o Ale do meu lado. O médico cortou o cordão e a pediatra a pegou pra limpar, ali no quarto mesmo. Ela ficou mais um pouco comigo e depois o Ale foi levá-la ao berçário com a enfermeira.

Não tive laceração, não levei nenhum ponto, nem tomei qualquer medicamento.



Considerações sobre o parto
Hoje, quase 5 meses depois do nascimento da minha filha, já não acho que o meu parto foi "perfeito". Numa próxima gestação, sem dúvida, não vou parir no hospital, vou parir em casa, pra não ter que me separar do meu bebê por 1 ou 2 ou 3 horas. E também vou esperar que a bolsa se rompa sozinha.

Mas considerando que no início da gravidez já haviam "me condenado à cesárea", acho que a Ana Beatriz e eu nos saímos muito bem. O meu marido, que morria de medo do parto normal por causa do terrorismo dos médicos, e que achava que eu estava fantasiando demais, ficou do meu lado, me apoiou, literalmente me segurou nos braços, e isso foi muito importante.

Ter encontrado um médico que me respeitasse, que respeitasse minhas vontades também foi importante, mas mais que isso, eu ter acreditado que eu podia, eu ter buscado dentro de mim a força feminina de parir, ter buscado em todas as minhas antepassadas que pariram antes de mim...
Isso me fortaleceu como mulher, me sinto uma mulher muito melhor, mais forte, mais corajosa. E durante todo o tp, eu nem me lembrei da história de que meu útero podia romper, por causa da cirurgia, e bla´, blá, blá....

Lembrava sim de todas as conversas, as informações que eu tive aqui (na lista), de relatos... lembrava de que disseram que o tp era um mar, que as contrações vinham como ondas... e sentia isso, e me deixava levar.

Considerações sobre as considerações...
Hoje já faz 1 ano e 7 meses que a Bia nasceu. Ler esse relato me encheu de emoção, revivi cada momento. Faria tudo de novo. Mas faria melhor. Não teria permitido que o médico estourasse a bolsa. Teria esperado mais um pouco. Teria tentado escutar mais o meu corpo e não as orientações do médico pra fazer ou não fazer força.

Outra coisa muito ruim de ter o filho no hospital, é que ele TEM que ser levado para os procedimentos. Se fosse na minha casa, ela ficaria mais comigo, seria avaliada ali, do meu lado, não teríamos ficado algumas horas separadas.
Mas fora isso, eu continuo me sentindo muito corajosa por ter acreditado que podia parir e ter buscado o meu parto.


O grande amor da minha vida

6 comentários:

  1. Parabéns por como você conseguiu conduziu o parto pra que ele acontecesse da melhor maneira possível! Me identifiquei muito com o seu relato de parto, apesar de o meu ter sido domiciliar. Realmente a melhor coisa é poder ficar em tempo integral com o bebê. O anestesista que eu consultei por rotina antes do parto também me disse que eu "não aguentaria" ter parto normal sem anestesia. Enfim, ele era "indispensável", não é?
    Um beijo com admiração,
    Denise

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  2. Denise, admirada estou eu, pois acabei de ler o seu relato. Sei que vc tbm é da lista. Obrigada pelas palavras.
    bjs, :)

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  3. Adorei!!!
    Já tinha ouvido seu relato, mas agora é bem diferente... agora q eu tbm vivi essa experiência d parir.
    Parabéns Li!!
    Bj

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  4. A cada post me sinto mais orgulhosa de você, principalmente por ter acompanhado tão de perto toda a sua convicção e fé de que ia dar tudo certo. E deu! A Bia está cada vez mais linda e você feliz. E o melhor de tudo é que tem convidado muitas mulheres a 'retomarem' a sua natureza valorizando o parto natural. Espero que um dia eu possa dar à luz a Nina de forma tão especial!

    Bjus

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  5. Obrigada, Deia, vc realmente acompanhou e aguentou as minhas buscas e crises...rsrs.... tenho certeza que você irá vivenciar tudo isso, ainda mais você, que traz consigo a Deusa, que nada mais é que a força feminina latente. =]

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  6. Adorei seu relato,pena que eu não tive a oportunidade de viver tudo isso,não sei nem dizer se foi necessário passar por duas cesárias ou pura falta de informação,agora me realizo pelo menos com a amamentação ...Isabela esta com 3 meses e com 6 kg só mamando no peito,só alegria!!!!
    Bjs
    Renata M.Marquezeli

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